No encontro, ministro anunciou GT para avaliar propostas do CFM para levar o médico para as áreas distantes, como a criação da carreira de estado no SUS
Um Grupo de Trabalho (GT) será criado pelo Ministério da Saúde para analisar a implementação das propostas encaminhadas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para solucionar a falta de acesso à assistência nos municípios do interior e nas periferias dos grandes centros. Este foi o principal resultado da primeira reunião entre os presidentes das três entidades médicas nacionais e o ministro Alexandre Padilha na tentativa de solucionar o impasse surgido desde que setores do Governo anunciaram a intenção de “importar médicos” sem a revalidação de diplomas.
Para o presidente do CFM, Roberto Luiz d’Avila, o anúncio da criação deste GT não resolve a pendência e nem elimina a preocupação das entidades médicas com relação à vinda dos médicos formados em outros países sem passar por testes de avaliação de conhecimento. “Não há xenofobia quanto aos “estrangeiros”, mas é só podem exercer medicina no país os candidatos aprovados no Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida) em seus moldes atuais. Sem isso, a população estará exposta a situações de risco”, disse, logo após o encontro que ocorreu nesta quarta-feira (5), no Ministério da Saúde, em Brasília.
Debate antecipado – A defesa do Revalida como forma de avaliação desses médicos foi feita também pelos presidentes da Associação Médica Brasileira (AMB), Florentino Cardoso, e da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Geraldo Ferreira. Ambos fizeram o mesmo apelo a Padilha, que, durante a conversa, disse que este debate (sobre a “importação de médicos”) foi antecipado inadvertidamente pelo ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, ao falar sobre acordo para a vinda de 6 mil médicos cubanos ao Brasil, durante conversa com a imprensa, no início de maio.
Em sua avaliação, o ministro admitiu que o embate entre médicos e Governo sobre a “importação” de profissionais tem causado desgastes para ambos os lados. Portanto, entende ser necessário iniciar um processo de construção de diálogo a partir da retomada da discussão sobre o tema com os grupos interessados. Durante o encontro, o ministro reconheceu que, até o momento, não há qualquer proposta concreta para ser apresentada e garantiu que nenhuma decisão final sobre o assunto será tomada sem antes passar pelos representantes das entidades médicas.
O 1º vice-presidente do CFM, Carlos Vital, que também esteve na reunião, demonstra cautela ao avaliar o empenho do Ministério. “Queremos resolver este impasse para preservar o bom exercício da Medicina e a qualidade do atendimento no país. No entanto, temos, por enquanto, apenas uma promessa de diálogo por parte do Ministério da Saúde. Quando o GT for efetivamente formado, as reuniões avançarem e as conclusões forem colocadas em práticas, entenderemos que há realmente uma postura de efetiva construção”, salientou.
Propostas em estudo – O objetivo do GT anunciado será discutir dois pontos. O primeiro é Programa de Interiorização do Médico Brasileiro, que, no entendimento do CFM, é uma opção segura para garantir a imediata interiorização da Medicina, pois valoriza o profissional nacional, estimula a melhora da infraestrutura de trabalho e cria condições efetivas para atração e fixação dos médicos em áreas remotas. A medida teria caráter emergencial e transitório, com validade máxima de 36 meses, com foco nos municípios de até 50 mil habitantes.
A segunda proposta é a da criação de uma carreira de Estado no Sistema Único de Saúde (SUS) para médicos, enfermeiros, dentistas, farmacêuticos e bioquímicos, nos moldes das que já contemplam os cargos de juiz e promotor. O acesso seria por concurso público, realizado pelo Ministério da Saúde.
Dentre as características desta carreira, constam jornada de trabalho de 40 horas semanais no atendimento exclusivo ao SUS, com Plano de Cargos, Carreira e Salários, o que permitiria que esses profissionais ascendessem com remuneração compatível com o estabelecido pela Federação Nacional dos Médicos (Fenam). Além disso, o Estado seria obrigado a oferecer a infraestrutura de trabalho e equipes de apoio.
Imagem distorcida – Na reunião de quase duas horas, o ministro ouviu outras críticas das entidades médicas. O presidente da AMB disse estranhar a contradição entre declarações de Alexandre Padilha à imprensa sobre a qualidade dos serviços e a realidade da assistência em saúde na rede pública brasileira. “Tenho certeza de que o senhor não sabe do que está acontecendo”, supondo que este descompasso viria de “maquiagens” nos estabelecimentos de saúde antes de visitas oficiais.
Florentino Cardoso também fez comentários duros sobre o funcionamento do Programa de Valorização da Atenção Básica (Provab). Segundo ele, compromissos assumidos pelo Governo com os médicos que se engajaram no Programa não estão sendo cumpridos: “conheço colegas que estão em locais onde o posto de saúde não tem água há três meses e o reboco cai das paredes”, citando a precariedade das instalações e da infraestrutura disponível. Padilha pediu que este caso fosse apurado e lembrou que o Programa passa por auditorias sistemáticas.
A situação da cidade do Rio de Janeiro, que concentra a maior rede federal de hospitais do país, também foi lembrada. O presidente da Fenam, Geraldo Ferreira, chamou atenção para a situação dos médicos lotados que, segundo contou, estão a um passo da decretação de uma greve por conta da baixa remuneração, entre outros fatores. “Estes e outros problemas têm sido relatados pelos Conselhos e pelas entidades médicas às autoridades. Eles apenas atestam as sérias dificuldades enfrentadas pelo SUS, que atrapalham a atuação dos médicos. É preciso que o Governo adote medidas estruturantes para melhorar a infraestrutura e estimular a ida do médico para o interior”, finalizou Roberto d’Avila, expressando ceticismo com relação às promessas feitas até o momento.